Importância da FENAGRI para o agronegócio da fruticultura irrigada no Vale do São Francisco

Ao se estudar as Feiras Agropecuárias é preciso entender como elas se relacionam com os processos mais amplos da sociedade, como as inovações técnicas na agricultura, a inserção brasileira no mercado internacional

16/06/2023 19:58
Importância da FENAGRI para o agronegócio da fruticultura irrigada no Vale do São Francisco

Resumo - Este trabalho propõe analisar o cenário da FENAGRI- Feira Nacional de Agricultura Irrigada na região do Vale do São Francisco, no Pólo Petrolina-PE/Juazeiro-BA, com foco nas cadeias produtivas da manga e da uva, e suas perspectivas comerciais nos últimos dez anos. Esta feira foi escolhida como objeto de estudo, pois é composta por vários eventos em sua programação, que se destacam na difusão da tecnologia agrícola. Já o recorte espacial proposto, se justifica na medida em que as feiras agropecuárias, em sua maioria voltadas ao agronegócio, encontram todas as condições para serem realizadas nesta Região, a qual é, ao mesmo tempo, produtora e exportadora de frutas. Assim, neste trabalho, optou-se por abordar o papel desta feira, principalmente na comercialização das principais frutas cultivadas nesta região (manga e uva). Em relação ao referencial teórico-metodológico evidenciam-se conceitos, como: forças produtivas, relações de produção, progresso técnico, inovação, difusão de tecnologia e agronegócio. Ademais, considerando-se os principais resultados obtidos, observa-se que tanto na comercialização de manga, quanto na comercialização da uva, as rodadas de negócios promovidas em parcerias de entidades e empresas, como o SEBRAE, Valexporte, com apoio da Embrapa e da CODEVASF, ultrapassa um volume de 500 milhões de reais. O mesmo ocorre com o avanço das tecnologias desenvolvidas que visam à eficiência produtiva para esses cultivos irrigados.

Introdução - Este trabalho é um dos resultados da pesquisa realizada pela equipe do Setor de Implementação da Programação de Transferência de Tecnologia e pesquisadores da área de socioeconomia da Embrapa Semiárido, com objetivo de compreender o papel da FENAGRI ? Feira Nacional de Agricultura Irrigada na difusão de tecnologias que concorrem para o avanço do agronegócio na Região do Pólo Petrolina-PE/Juazeiro-BA, no Vale do São Francisco. Considerando o período de 2009 a 2018, para compreender o papel desta feira agropecuária na difusão da tecnificação agrícola nesta importante região. Para isso foram analisadas as rodadas de negócios realizadas em cada edição deste evento, as quais foram selecionadas devido a sua representatividade e por apresentarem valores de negócios superiores a 300 milhões de reais na última edição.

A feira foi escolhida como objeto de estudo, pois consiste em evento que se destaca na difusão da tecnologia agrícola, à medida que demonstra aos agricultores, técnicos e empresários, as tecnologias, inovações e produtos que cada uma das empresas participantes tem a oferecer, possibilitando que eles comparem os resultados e serviços dos produtos oferecidos. Além disso, movimentam a economia local e regional através de aquisições via recursos próprios ou financiamentos (Bauermann,2022).

A área de Transferência de Tecnologias da Embrapa Semiárido é responsável pela elaboração de grande parte da programação dos eventos técnicos ? científicos da feira, juntamente com os pesquisadores, desde seminários, visitas técnicas, palestras, dias de campo, exposição em estande institucional, minicursos e rodadas de negócios. Toda esta programação é realizada a partir das demandas do setor produtivo, juntamente com a equipe de pesquisadores da Embrapa que compõem os núcleos temáticos de agricultura irrigada, agropecuária dependente de chuva e recursos naturais. Neste sentido são realizados anualmente, e de forma antecipada, workshops e seminários promovidos pela Embrapa e os setores produtivos da região, visando atender suas demandas.  E daí deriva a grade programática em cada edição da feira, a qual é realizada anualmente, alternando-se entre os municípios de Petrolina-PE e Juazeiro-BA.

Por outro lado, a ausência de trabalhos específicos sobre o assunto nas diversas ciências, em especial nas ciências agrárias, também foi um fator preponderante para esta proposta de estudo. Em outras áreas do conhecimento, também foram encontrados poucos trabalhos sobre feiras, os quais, de modo geral, acabam abordando particularmente a historicidade desses eventos.

Já o recorte espacial desta proposta, se justifica à medida em que este evento, em sua maioria voltada ao agronegócio, encontram todas as condições para serem realizadas na Região do Vale do São Francisco, a qual é, ao mesmo tempo, produtora e exportadora de frutas. Isso pode ser observado em dados oficiais, como os apresentados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) na Pesquisa Agropecuária no ano de 2020.

Estes dados apontam que a região tem notoriedade na produção de frutas irrigadas, onde a manga e a uva se apresentam como principais cultivos. Também detém grande parte da produção de olerículas, cucurbitáceas, caprinos e ovinos, com potencial na produção de vinhos e espumantes.

Analisando os Estados separadamente, a Bahia se evidencia como produtora de cebola, melão, tomate, manga, banana, laranja, coco, cacau, café e uva; e na pecuária, caprinos, ovinos e bovinos, além da psicultura. Em Pernambuco predomina a produção de manga e uva, banana, coco; e na pecuária, caprinos, ovinos, aves, suínos e bovinos.

Desta maneira, este trabalho propõe analisar a importância das edições da FENAGRI nas principais cadeias produtivas do agronegócio no Vale do São Francisco, a qual se constitui uma importante produtora e exportadora para o agronegócio do Brasil.

Para chegar a tal resultado, a metodologia do trabalho foi pautada na seleção, leitura e análise de referenciais bibliográficos, no levantamento de materiais específicos de cada feira e de dados econômicos que corroborassem com a pesquisa.

Em relação ao referencial teórico-metodológico evidenciam-se conceitos, como: potencial produtivo da região, progresso técnico, inovação, técnica/tecnificação e agronegócio. Ademais, considerando os principais resultados obtidos, observa-se que tanto no cultivo de manga, quanto no cultivo da uva, vem aumentando em volume de comercialização e que existem novas possibilidades de avanços em cultivos de goiabeira, citrus, olericultura e caprinovinocultura.

Metodologia - A metodologia utilizada nesta pesquisa consta de um estudo de caso sobre a ?rodada de negócios? que ocorre em cada edição da feira. Em seguida realizou-se um levantamento sobre Agronegócio disponível no site do Instituto Brasileiro de Comércio Exterior. Na segunda etapa realizou-se o levantamento, leitura e análise de referenciais bibliográficos. Foram identificados artigos, revistas eletrônicas, livros, teses, dissertações e outras obras que abordassem à demanda teórica.

Na terceira etapa da pesquisa foram levantados materiais específicos de cada rodada de negócios e dados econômicos que corroborassem com a pesquisa. Esses levantamentos foram realizados a partir de listas de presenças dos participantes constantes nos sistema de registros de eventos da Embrapa, de materiais online, pesquisa documental para resgatar resultados de entrevistas com responsáveis pela organização, frequentadores e expositores, órgãos como SEBRAE-BA e SEBRAE-PE, prefeituras dos municípios de Juazeiro e Petrolina, além de fontes como IBGE, Sidra (Sistema IBGE de Recuperação Automática), e IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). No quarto passo, parte dos materiais e dados obtidos, foram analisados, havendo a produção de tabelas, mapas, gráficos, redação de trabalhos, entre outros.

Referencial teórico - No decorrer da pesquisa algumas bases teóricas evidenciam-se como os conceitos ?difusão de tecnologia? e ?agronegócio? Marx (2017 [1890]). Tais conceitos são de suma importância, para caracterizar as regiões em desenvolvimento e mudança dos modos de produção, ou seja, do modo em que a atividade agrícola transforma todo um contexto sócio-econêmico.

Desta maneira, identifica-se neste estudo, que uma das principais formas de contribuição da feira ? FENAGRI?, é proporcionada pela realização da ?Rodada de Negócios?.

A ?Rodada de Negócios? consiste em um instrumento de marketing dinâmico utilizado para promover a aproximação entre empresários com a realização de eventos pontuais (SEBRAE, 2018).

Transferência de Tecnologia - Para a Embrapa, segundo a sua Política de Inovação publicada em 2019, transferência de tecnologia é o processo de disponibilização de conhecimento técnico científico embutido/embarcado em ativos tecnológicos, tangíveis e intangíveis, para o setor produtivo. Nesse caso, estão inclusos: a coleção biológica, o banco de dados, os ativos de base biotecnológica, a metodologia, o produto, o processo e a prática agropecuária. Seus propósitos fundamentais são: a incorporação de conhecimentos e tecnologias ao processo produtivo; o monitoramento dos impactos econômicos, sociais e ambientais gerados; e a retroalimentação do processo de pesquisa e desenvolvimento. O processo da transferência tecnológica pode se dar por meio de qualquer procedimento de interação social, incluindo, por exemplo, negócios.

Ao se estudar as Feiras Agropecuárias é preciso entender como elas se relacionam com os processos mais amplos da sociedade, como as inovações técnicas na agricultura, a inserção brasileira no mercado internacional, as políticas agrícolas e a difusão tecnológica para a agricultura. Logo, o avanço das formas produtivas, apresentadas no momento como o progresso técnico, apresentam papel central na explicação do tema (GONÇALVES, 2006).

Nesse contexto, progresso técnico e a inovação, também se tornam fundamentais, pois ?a história do progresso técnico é inseparável da história da própria civilização, na medida em que trata dos esforços da humanidade para aumentar a produtividade sob uma gama extremamente diversificada de condições ambientais? (Rosemberg, 2006, p. 17). Neste sentido, o progresso técnico está intimamente conectado a inovação e difusão de novas tecnologias que impactam sobre o crescimento da produção e da produtividade.

Concomitante, ?as técnicas são um conjunto de meios instrumentais e sociais, com os quais o homem realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço?. (SANTOS, 2006, p. 16).

Por fim, em concordância com (CONTINI, 2006 e Bauermann,2022) entende-se o agronegócio, enquanto ?cadeia produtiva que envolve desde a fabricação de insumos, passando pela produção nos estabelecimentos agropecuários e pela transformação, até seu consumo?. Assim, neste trabalho, optou-se por abordar apenas os segmentos específicos das culturas da manga e da uva, e suas principais unidades de processamento, conforme apresentado na introdução.

Região do Estudo/Vale do São Francisco - O Brasil é o terceiro maior produtor de frutas no mundo, ficando atrás apenas da China e Índia, o que mostra a relevância do setor para a economia brasileira (SEBRAE, 2015). E grande parte desta produção é oriunda da região do vale do São Francisco.

O Polo Petrolina-PE/Juazeiro-BA, compreende os principais estados produtores da cultura da manga no Brasil e o Estado de São Paulo/SP ocupa a terceira posição; nos perímetros irrigados da CODEVASF, atualmente, existe um conjunto de mais de dez projetos públicos de irrigação, entre Pernambuco e Bahia. Essas áreas produziram, em 2019, cerca de 518.231 mil toneladas de manga, numa área cultivada de 38.270 mil hectares, tendo um rendimento gerando uma produção de 36,56 toneladas/hectare em Pernambuco e para a Bahia 18,35 toneladas/hectare (EMBRAPA, 2019). As principais variedades cultivadas no Vale são a Tommy Atkins, Palmer, Kent e Keitt. Dentre essas variedades, as duas mais produzidas na região são a Tommy Atkins e a Palmer. Todas essas variedades são basicamente exportadas para todos os mercados, comércio externo e interno (EMBRAPA, 2019).

 

Na Região do Vale do São Francisco, as principais feiras agropecuárias são a FENAGRI e a EXPOVALE, apresentada nas fotos abaixo, a qual foi criada em 1986 e após os anos 2000, passaram a ser realizadas de forma alternadas nos municípios de Juazeiro-BA e Petrolina-PE. Entretanto, as feiras mais importantes das demais regiões do Brasil, exceto a Agrishow (1994), são criadas a partir dos anos 2000, o que reforça a teoria de que a expansão do agronegócio e a tecnificação da agricultura principalmente para as Regiões Nordeste e Centro-Oeste, se deve pelo gigantesco valor dos volumes de negócios e por duas delas, a Bahia Farm Show em Luis Eduardo Magalhães, a Tecnoshow Comigo-GO e a Agrishow-SP, terem se tornado as maiores do país.

Resultados e discussão - A FENAGRI vem se consolidando a cada edição, principalmente pelo volume de negócios viabilizados, conforme se percebe na tabela 1, onde se expõem as principais temáticas abordadas em suas respectivas edições e volume comercialização em rodadas de negócios em cada uma de suas edições.

Analisando-se os percentuais de exportação de frutas no Brasil, é possível observar que esta região é responsável por 81,4% da produção nacional de manga, 29,22% de uva, 27% de coco, 24,14% de banana. Destes percentuais, 30% da produção de manga nacional, 75% e 56% da uva produzida no Brasil, é oriunda da região do Vale do São Francisco, conforme se apresentam na tabela elaborada pela Abrafrutas (Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados) em 2019.

Nesta região, os municípios de Petrolina-Pe e Juazeiro-Ba, concentram o maior volume de produção e comercialização por oferecer as condições necessárias ao escoamento, seja através do Mercado do Produtor, localizado em Juazeiro, seja pela atuação da Valexport no município vizinho (SIDRA, IBGE, 2017).

A Fenagri é a maior vitrine de um agronegócio frutícola que responde hoje, segundo dados da Valexport, por 94% de toda manga e 98% de toda uva exportada no Brasil. O Vale do São Francisco possui 120 mil hectares irrigados e um potencial para atingir 260 mil hectares nos próximos anos. São aproximadamente mais de um milhão de toneladas de frutas produzidas anualmente e um faturamento em torno de US$ 500 milhões.Considerada a maior feira de fruticultura irrigada da América Latina, a FENAGRI chega em 2023 completando 38 anos como vitrine para a promoção e realização de negócios, transferência de tecnologias e a divulgação, em todo o mundo, das potencialidades do Vale do São Francisco.

Referências: ABRAFRUTAS ? O Brasil é o terceiro maior produtor de frutas do mundo. Disponível em: https://abrafrutas.org/2019/03/brasil-e-o-terceiro-maior-produtor-defrutas-do-mundo-diz-abrafrutas/ Acesso em: 22/02/2022. Bauermann, A. K. FEIRAS AGROPECUÁRIAS E CADEIAS PRODUTIVAS DO AGRONEGÓCIO NA REGIÃO SUL DO BRASIL. Anais do XIV ENANPEGE .ISSN 2175-8875 CONTINI, E. et al. Evolução recente e tendências do agronegócio. Revista de Política agrícola, Brasília, ano XV, n. 1, p. 5-28, jan./fev./mar. 2006. GERMER, C. M. Marx e o papel determinante das forças produtivas na evolução social. Crítica Marxista 29, São Paulo: Ed. Unesp, 2009, p. 75-95 GONÇALVES, J. S. Agricultura sob a égide do capital financeiro: passo rumo ao aprofundamento do desenvolvimento dos agronegócios. Informações Econômicas. São Paulo, v.35, n.4. abr. 2005, p. 07-35. EMBRAPA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.Publicações e bibliotecas. Aceesso em 05/05/23. IBGE. Pesquisa Industrial Anual: Empresa 2017. Rio de Janeiro: IBGE, Coordenação de Indústria, 2017. 8 p. Disponível em:<https://biblioteca.ibge.gov.br/index.phpbibliotecacatalogo?view=detalhes&id=71719>. Acesso em: 20 jun. 2019. ROSENBERG, N. Por Dentro da Caixa-Preta: tecnologia e economia. Campinas: Ed. Unicamp, 2006, p. 67-92. SANTOS, Milton. Técnica, Espaço, Tempo: Globalização e Meio Técnico-científico-informacional. 5. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2013. 174 p. SEAGRI- BA, Secretaria de Agricultura do Estado da Bahia. Disponível em: https://www.seagri.ba.gov.br.Acesso em:05/06/23 SEBRAE, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e pequenas Empresas. Disponível em:https://sebrae.com.br/rodadasdenegocios, acesso em 05/06/23. SIDRA. Produção Agrícola Municipal. 2017. Disponível em: <https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pam/tabelas>. Acesso em: 09 maio 2019. SIDRA. Pesquisa Pecuária Municipal. 2017. Disponível em: <https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/ppm/referencias>. Acesso em: 10 maio 2023.

*Lícia Mara Marinho da Silva/Analista A - Engª. Agrônoma - SIPT - Setor de Implementação da Programação da Transferência de Tecnologia/Embrapa Semiárido/Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) - Petrolina/PE - Telefone: +55 (87) 3866-3636 | Fax: +55 (87) 3866-3820 - licia.marinho@embrapa.br





Read more...