Morango tem boa safra no RS com clima favorável, mas pragas exigem atenção dos produtores

Leia também: Como o cultivo semi-hidropônico está redefinindo a produção de morango no Brasil; entrevista exclusiva do pesquisador Luís Antunes da Embrapa à IA de Minas, traz radiografia da fruta no país

14/11/2025 12:14
Morango tem boa safra no RS com clima favorável, mas pragas exigem atenção dos produtores

Boletim da Emater/RS-Ascar destaca condições climáticas ideais para o cultivo, porém alerta para o avanço da antracnose e presença de ácaro-rajado em algumas regiõesClima ideal impulsiona qualidade e produtividade do morango - O mais recente Informativo Conjuntural da Emater/RS-Ascar indica que o clima segue favorável ao cultivo de morango na região de Caxias do Sul. As temperaturas amenas, com média em torno de 20 °C e amplitude térmica elevada, criaram condições ideais para o desenvolvimento das lavouras.

A sanidade dos morangueiros é considerada satisfatória, com os produtores mantendo tratamentos fitossanitários preventivos baseados em produtos biológicos para o controle de oídio, mofo-cinzento e antracnose. No entanto, a antracnose, conhecida popularmente como "flor preta", tem se tornado mais frequente, gerando preocupação entre os agricultores. 

Em Nova Petrópolis, produtores também relatam casos de ácaro-rajado, praga que exige acompanhamento constante para evitar perdas na produção. 

Colheita avança, mas volume segue abaixo do esperado - Apesar das boas condições climáticas, o volume colhido ainda está abaixo do esperado para esta época do ano. Em Gramado, o morango in natura é comercializado entre R$ 20,00 e R$ 30,00 por quilo, enquanto o morango congelado tem preço médio de R$ 10,00/kg.

Já em Nova Petrópolis, houve aumento de preços em relação à semana anterior. Na venda direta ao consumidor, o produtor tem recebido entre R$ 20,00 e R$ 35,00/kg, e nas negociações com Ceasas, intermediários e mercados, os valores variam de R$ 15,00 a R$ 30,00/kg. 

Pelotas registra frutos de excelente qualidade - Na região de Pelotas, os cultivos de morango encontram-se em diferentes estágios, desde os tratos culturais até a colheita. O boletim destaca a excelente qualidade dos frutos, com bom calibre e sabor, reflexo direto das condições climáticas estáveis. Os preços praticados na região variam de R$ 12,00 a R$ 27,00/kg, dependendo da classificação e destino do produto. 

Soledade tem produção em alta e manejo eficiente - Em Soledade, o relatório aponta que a radiação solar, as temperaturas amenas e o maior fotoperíodo favoreceram o desenvolvimento das lavouras. O resultado é uma elevação na produção, na oferta e na qualidade dos frutos.

As cultivares de dias curtos já começam a apresentar redução na produtividade, mas o manejo sanitário constante e as podas leves de limpeza têm contribuído para manter a rentabilidade. O preço pago ao produtor oscila entre R$ 25,00 e R$ 35,00/kg. *EMATER/RS-Ascar - 12/11/2025. 

Como o cultivo semi-hidropônico está redefinindo a produção de morango no Brasil

Luís Eduardo Corrêa Antunes é graduado em Agronomia pela Escola Superior de Agricultura de Lavras (Esal) (1992), possui mestrado e doutorado em Agronomia/Fitotecnia pela Universidade Federal de Lavras (Ufla) e pós-doutorado pela Universidade da Flórida (EUA). No período de 1996 a 2002, atuou como pesquisador da EPAMIG, sendo gerente da EPAMIG Sul - Campo Experi-mental de Caldas (CECD), Caldas, MG, em seu último ano na Instituição; e coordenador Estadual do Programa de Fruticultura. Atualmente, é pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Manejo e Tratos Culturais, atuando principalmente na propagação e no manejo fitotécnico de plantas, como pessegueiro, mirtileiro, amoreira-preta e morangueiro. É bolsista de produtividade em pesquisa pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), atuando também como professor de pós-graduação nos Programas de Agronomia e Agricultura Familiar da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Nesta entrevista, Luís Eduardo Antunes avalia o cenário do cultivo de morangos no Brasil, bem como as vantagens e os pontos de atenção relacionados com a importação de mudas e com o cultivo semi-hidropônico. 

"O futuro passa pela nacionalização da produção de mudas de qualidade, pelo desenvolvimento de cultivares adaptadas à semi-hidroponia e pela automação de processos, como irrigação e

monitoramento de pragas. O sistema de produção de morangos fora do solo, em substrato, suspenso ou semi-hidropônico é visto como um dos pilares para uma produção mais sustentável,

eficiente e lucrativa no Brasil" - Foto: Paulo Lanzetta

IA - Em um contexto geral, qual a importância da cultura do morangueiro no Brasil?

Luís Eduardo Antunes - A cultura do morangueiro é de alta relevância socioeconômica, pois gera grande quantidade de empregos diretos, inclusive com alta participação da mão de obra familiar, e movimenta bilhões de reais, anualmente. O Brasil é líder em produção de morango na América do Sul e um dos maiores produtores mundiais, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), possuindo regiões produtoras próximas ao nível do mar, como Pelotas e Bom Princípio, no Rio Grande do Sul, e de altitude, como Senador Amaral e Bom Repouso, no Sul de Minas, a mais de 1.200 m. Estados consolidados, como Minas Gerais (maior produtor), Paraná, São Paulo e Rio Grande do Sul; e novas fronteiras, como o Nordeste brasileiro, abastecem o mercado interno com um produto de alto valor agregado e de qualidade reconhecida. 

IA - Quais os principais entraves que os produtores de morango enfrentam na atualidade?

Luís Eduardo Antunes - Não diria entraves, mas desafios que o ecossistema de produção precisa enfrentar. Há vários pontos a serem discutidos e observados: a dependência de cultivares e, em parte, de mudas importadas, que encarecem a produção e trazem riscos fitossanitários; a ocorrência e manejo de pragas (como o ácaro-rajado e o mofo-cinzento) e doenças (vermelhão); a demanda por mão de obra em todo o ciclo produtivo (preparo da área, plantio, tratos culturais, colheita e embalagem). Além disso, a grande sensibilidade às variações e aos fenômenos climáticos, como excesso de chuvas, granizo ou veranicos; e a escassez de fontes adequadas de água são desafios que o produtor enfrentasafra a safra. 

IA - A importação de mudas de morango supre as exigências dos produtores em termos de qualidade sanitária, genética e fisiológica?

Luís Eduardo Antunes - Embora as mudas de morango importadas, principalmente as oriundas de países como Chile, Argentina e Espanha, ofereçam qualidade genética e sanitária, visto que passam por quarentena supervisionada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), o processo de importação é oneroso e estressante para as plantas. Frequentemente, há problemas de adaptação ao nosso clima, além do risco de introdução de novas pragas, apesar da quarentena. Estima-se que 25% das mudas de morango utilizadas anualmente pelos produtores são importadas, o que gera uma evasão de divisas enorme. Antes da importação em escala de uma determinada cultivar, os importadores traziam para o Brasil, sob código, cultivares lançadas por Programa de Melhoramento privado ou público, como o da Universidade da Califórnia, EUA, que tem mais de cem anos no mercado, com potencial de tornarem-se preferências na escolha do produtor, e as testavam nas regiões produtoras. A qualidade fisiológica pode ser comprometida por atrasos logísticos, afetando o "stand" inicial da lavoura. Dessa forma, surge a oportunidade do desenvolvimento de cultivares brasileiras, adaptadas às nossas condições climáticas, e com potencial de produção das mudas sem a necessidade da passagem de frio no viveiro. Certamente, este é um dos desafios dos programas brasileiros que desenvolvem genética "verde e amarela" de morangos. 

IA - Em sua opinião, quais as vantagens do sistema semi-hidropônico em relação ao convencional?

Luís Eduardo Antunes - A produção de morangos tem passado por transformações nas últimas duas décadas. A produção em substrato, suspensa, em abrigos, ou mais comumente conhecida como semi-hidropônica tem ganhado espaço na preferência dos produtores de morangos. Semi-hidroponia é um sistema de cultivo sem solo, onde os morangueiros são cultivados em recipientes (como canaletas, sacos ou vasos), preenchidos com um substrato inerte (fibra de coco, casca de arroz carbonizada ou lã de rocha). A principal característica que define o sistema como semi-hidropônico é que o substrato age como suporte físico para as raízes, mas não fornece nutrientes signifi cativos. Estes são fornecidos de forma precisa e controlada por uma solução nutritiva (água + fertilizantes) que é aplicada diretamente no substrato, geralmente por um sistema de gotejamento automatizado. 

Em resumo, é "hidroponia", porque a nutrição é feita via água (solução nutritiva); e é "semi", porque utiliza um meio de suporte (substrato) para as raízes, diferentemente da hidroponia de raiz nua, como o sistema Nutrient Film Technique (NFT). Este método oferece um controle absoluto sobre a alimentação e a hidratação da planta, resultando em ganhos de produtividade, de qualidade e de manejo fitossanitário. Como vantagens, citam-se:

maior produtividade (m2 de abrigo); redução da contaminação biológica, visto que os morangos ficam suspensos e apresentam menos sujidades; controle fitossanitário mais eficiente; redução de doenças relacionadas com o solo e menor incidência de podridões; economia de insumos, com a possibilidade do uso mais eficiente de água e fertilizantes; ergonomia e eficiência, isto é, trabalho em posição ereta, reduzindo o esforço físico na colheita e em tratos culturais, aumentando o volume de morangos colhidos por trabalhador quando comparado ao sistema no solo; independência do solo, o que permite o cultivo em áreas com solos degradados ou com histórico de problemas. Como desvantagem, cita-se o alto custo de implantação, que varia de R$15 a R$ 25 por muda plantada, cujo payback deve ser amortizado nos anos subse- quentes de cultivo. 

IA - Há tendência de substituição do sistema tradicional pelo semi-hidropônico em todas as regiões produtoras de morango?

Luís Eduardo Antunes - Há uma tendência clara de expansão, mas não substituição total e imediata. A adoção é mais rápida em regiões onde a tecnologia se mostra economicamente viável, como em propriedades de médio e grande porte, próximas a centros consumidores que possuem reserva abundante de água. O alto investimento inicial ainda é uma barreira para pequenos produtores, impedindo uma substituição generalizada em todas as regiões. Portanto, os diferentes sistemas ainda conviverão por muito tempo. Isso porque muitos produtores são arrendatários, o que impede investimento em estruturas robustas a longo prazo. 

IA - A qualidade dos frutos produzidos no sistema semi-hidropônico supera a dos frutos produzidos no sistema tradicional?

Luís Eduardo Antunes - De modo geral não. Os frutos do sistema semi-hidropônico são tipicamente mais limpos (menos poeira e sujidades) porque estão suspensos, isto é, distantes do solo, uniformes em tamanho e cor, e, geralmente, com menor incidência de danos físicos e podridões. O manejo nutricional mais preciso também pode resultar em frutos com melhor sabor e valor nutricional. No sistema tradicional, o contato com osolo é um fator de risco para a contaminação biológica e a perda de qualidade. Do ponto de vista nutricional, ambos os sistemas são bons. 

IA - Como é o mercado para frutos produzidos no sistema semi-hidropônico?

Luís Eduardo Antunes - O mercado, em algumas regiões, é um pouco resistente, mas tende à expansão. Esses frutos, de forma geral, são bem-aceitos, especialmente em nichos que valorizam a qualidade e a rastreabilidade, como supermercados premium, feiras especializadas e programas de agricultura sustentável. A produção em ambiente protegido permite uma oferta mais constante ao longo do ano, atendendo melhor à demanda do mercado.

IA - Os custos de produção compensam a adoção do sistema semi-hidropônico?

Luís Eduardo Antunes - A médio e longo prazo sim, compensam. O investimento inicial é significativa-mente maior (estrutura de sustentação, plástico de cobertura, substrato, sistema de irrigação, caixa d'água, adubos e mudas), no entanto, esse custo é compensado pelo aumento expressivo da produtividade, refletido pela possibilidade de colheita na mesma planta em anos subsequentes (podendo ser o dobro ou mais da colheita que se consegue em apenas uma safra, que gira entre 800 e 1.200 g/planta/ano); pela redução de perdas com doenças; pela economiade insumos e pelo aumento do rendimento de colheita. A viabilidade econômica depende de um planejamento financeiro adequado e de um manejo técnico eficiente. Claro, a partir da segunda safra, o calibre dos frutos tende a diminuir, com o aumento do número de coroas. Portanto, manejos de limpeza e poda são necessários para manter a planta produzindo adequadamente morangos de tamanho e peso demandados pelo mercado. A troca das mudas dependerá do estado fitossanitário que se encontra, do mercado que o produtor busca e da exigência de seus clientes. 

IA - Qual a sua percepção a cerca das pesquisas realizadas sobre este tipo de sistema de produção no Brasil e no mundo?

Luís Eduardo Antunes - As pesquisas, tanto no Brasil, lideradas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), pelas Organizações Estaduais de Pesquisa Agropecuária (Oepas) e pelas universidades e institutos federais e estaduais, quanto no mundo, são bastante avançadas e consistentes. Em abrigos, estufas e fazendas verticais, o cultivo do morango vem passando por transformações e demandando cada vez mais informações científicas. No Brasil, o foco tem sido o desenvolvimento de substratos alternativos (produção orgânica); a busca por fontes locais; a otimização de soluções nutritivas para as mais diversas condições de clima; a introdução e o desenvolvimento de novas variedades adequadas ao nosso clima e sistema de produção; e a validação econômica do sistema. O País está na vanguarda da adaptação desta tecnologia para climas tropicais e sub-tropicais. 

IA - Quais as expectativas futuras com relação ao sistema semi-hidropônico no Brasil?

Luís Eduardo Antunes - As expectativas são extremamente positivas. A tendência é de crescimento contínuo da área cultivada com este sistema. O futuro passa pela nacionalização da produção de mudas de qualidade, pelo desenvolvimento de cultivares adaptadas à semi-hidroponia e pela automação de processos, como irrigação e monitoramento de pragas. 

O sistema de produção de morangos fora do solo, em substrato, suspenso ou semi-hidropônico é visto como um dos pilares para uma produção mais sustentável, efi ciente e lucrativa no Brasil, que embarca novas experiências sensoriais, em sabor, crocância e açúcares, e claro, conservando-as adequadamente até o consumo. 

*Matéria da jornalista Mariana Vilela Penaforte de Assis/Epamig - Informe Agropecuário. Produção de morangos em sistema semi-hidropônico, Belo Horizonte, v.46, n.331, 2025.