Introdução - A fruticultura irrigada desempenha um grande papel na economia do Pólo Petrolina-PE/Juazeiro-BA, na região Vale do São Francisco, principalmente num mercado em ascensão, a exportação de manga e uva. Segundo estudos da Embrapa (Empresa brasileira de Pesquisa Agropecuária) e da CODEVASF (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba).Desta região saem grande parte destas frutas que serão despachadas para supermercados mundo afora e para o Brasil. Nesta atividade a presença de mulheres é forte nos cultivos da uva de mesa, que requer habilidade e delicadeza no trato com as parreiras. Em tratos culturais, como raleio, desbrota e livramento, são feitas quase que exclusivamente por mãos femininas. Estas também são maioria nos packing houses, setor onde as frutas são selecionadas, embaladas e refrigeradas para atender aos padrões e protocolos de exigências dos mercados internacionais.
Este trabalho tem como objetivo principal identificar as potencialidades de inovação tecnológica no que se refere à atuação da mulher na viticultura do Vale do São Francisco, especialmente no campo. Fundamental para um setor que vem se consolidando e conquistando espaço cada vez maior no agronegócio exportador, e repleta de desafios tecnológicos e sociais.
A metodologia consiste em levantamento de dados obtidos junto às instituições de pesquisa agropecuária, como do Observatório da Uva da Embrapa Semiárido, IPEA, IBGE, Universidades e do Instituto Federais de Educação, além de cooperativas ligadas ao agronegócio regional, como a Associação dos Produtores e exportadores de Hortigranjeiros e Derivados do Vale do São Francisco (Valexport) e Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas). O público-alvo foram as trabalhadoras de empresas agrícolas do Vale do São Francisco, especificamente na cidade de Petrolina-PE. Para o levantamento foram consultados relatórios de pesquisa desenvolvida pela Embrapa e das Secretarias Estaduais de Agricultura, da fruticultura no município de Petrolina, bem como, dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), do IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), do CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) e empresas da região do Vale do São Francisco.
Os dados coletados indicam que houve um déficit de aproximadamente 10% no número de mulheres nos pomares e packing houses de 2023 a 2024, devido ao incremento da mão-de-obra safrista na região do Vale do São Francisco. No entanto, ainda são enormes os desafios no que diz respeito ao uso de novas tecnologias, a exemplo de ausência de treinamentos para utilização de equipamentos como drones, softwares, entre outras ferramentas, combinados à necessidade de elevação da escolaridade.
Metodologia - Este estudo está classificado como básico, com caráter quali - quantitativo, bibliográfico,e documental. O público-alvo foram as trabalhadoras de empresas agrícolas aportadas no Vale do São Francisco, especificamente na cidade de Petrolina. Para o levantamento utilizou-se relatórios de pesquisa desenvolvida pela Embrapa, como o Observatório da Uva e das Secretarias Estaduais de Agricultura, da fruticultura no município de Petrolina, bem como, dados do IBGE, da CODEVASF, do IPEA, da Abrafrutas, Valexport e empresas da região do Vale do São Francisco.
Referencial Teórico/Região do Estudo Vale do São Francisco - O Brasil é o terceiro maior produtor de frutas no mundo, ficando atrás apenas da China e Índia, o que mostra a relevância do setor para a economia brasileira (SEBRAE, 2015). E grande parte desta produção é oriunda da região do vale do São Francisco.
O Polo Petrolina-PE/Juazeiro-BA, compreende os principais estados produtores da cultura da manga no Brasil e o Estado de São Paulo/SP ocupa a terceira posição; nos perímetros irrigados da CODEVASF, atualmente, existe um conjunto de mais de dez projetos públicos de irrigação, entre Pernambuco e Bahia.Com uma área de mais de 11 mil hectares plantados com videiras para mesa e vinho.
Fonte: Preparado pelos autores com base em BNB (2013), IBGE (2013a), DNOCS (2013) e CODEVASF (2013).
Na paisagem árida, até os primeiros brotos salpicarem com pontinhos verdes os galhos secos das parreiras. Em três meses, a paisagem já terá mudado: as plantas logo estarão carregadas de folhas e uvas. As mudas crescem agarradas a uma estrutura de madeira e arames, formando extensos corredores. O ciclo começa com a desbrota. Brotos inférteis se intercalam ao longo dos galhos e devem ser retirados, um a um, com as mãos. Assim, a seiva se concentra naqueles que vão vingar e render frondosos cachos - alguns com até um quilo, dependendo da variedade. Concluída a desbrota vêm o livramento e o raleio. Os cachos devem ser soltos para que não se enrosquem e ganhem espaço para crescer. Folhas que possam eventualmente encostar nas frutas e causar manchas devem ser retiradas.
Foto: Maria Auxiliadora Coêlho de Lima, Pesquisadora da Embrapa Semiárido, 2010
Dentre as tarefas desenvolvidas pelas mulheres na fruticultura destacam-se: desbrota (seleção do broto mais vigoroso eliminando o mais fraco, uniformizar o vigor dos ramos na planta, maior desenvolvimento dos ramos e cachos deixados na planta, diminuir o autos sombreamento das folhas e as incidências de doenças expondo melhor a parte aérea da planta à luz, ao ar e aos fungicidas aplicados), embalagem e raleio (consiste na remoção de 60 a 70% das bagas de cada cacho da uva para que as remanescentes se desenvolvam em tamanho e com qualidade), havendo uma espécie de rodízio onde as empregadas acabam exercendo todas essas atividades.
Todo o trabalho é executado manualmente com ajuda de, no máximo, uma tesoura. Cada cacho recebe uma atenção individual, cuidadosa e delicada para que as uvas atinjam seu máximo dulçor e peso. Uma vez terminada a colheita, as parreiras são podadas. Dali a poucos dias, novos brotinhos surgirão, dando início à mesma tarefa (SILVA, 202).
A organização do trabalho na fruticultura se divide entre assalariados temporários contratados por safra e aqueles que se tornam permanentes. As safristas ficam empregadas entre três e cinco meses por ano. No restante do tempo, perdem a renda e passam a viver com a incerteza da convocação para a próxima safra.
Há ainda os diaristas, que atendem a pequenos e médios produtores que não conseguem atender aos altos padrões de qualidade exigidos para exportação. A presença das mulheres é forte em todas essas modalidades de trabalho.
Mulheres trabalhando na pós-colheita de uva em packing-house. Foto: Carlos Laerte/Clas Comunicação e Marketing
Resultados e Discussão - Os dados da Tab. 1 levantado pelo observatório da uva da Embrapa Semiárido sobre o emprego na cultura da uva no Vale do São Francisco apresentam um déficit na atuação feminina em 2024(LIMA, J. R. F. de 2024). Em novembro de 2024, o estoque de empregos na cultura da uva é de 30.067 pessoas. No mesmo mês do ano passado, este valor era de 30.419, ou seja, existe uma diminuição do número de pessoas ocupadas na viticultura (CAGED, 2024).
O saldo de empregos na viticultura no mês de novembro de 2024 no Vale do São Francisco é negativo, de -1.257 pessoas, ou seja, o total de contratações (1.839) foi menor do que o total de demissões (3.096). Em relação ao mesmo mês do ano passado, se tem uma melhora no saldo total (-1.344 em 2023 e -1.257 em 2024), pois o número de pessoas que mantiveram o emprego foi maior.
Dos contratados no mês, 971 são do sexo masculino (52,80% do total) e 868 do sexo feminino (47,20%). Em relação à idade, 13,65% dos contratados tem até 21 anos, 13,65% até 24 anos, 11,85% até 27 anos e 8,75% até 30 anos. Tabela 1. Evolução do Saldo de Empregos Gerados na Viticultura em 2023 e 2024
Fonte: CAGED reprocessado pelo Observatório de Mercado de Uva da Embrapa, 2024
Sobre o nível de escolaridade, a maioria das admissões é de pessoas com ensino médio completo (667). Do total de contratados, 36,27% possuem este nível de escolaridade.Os dados utilizados nesta análise são mensais e disponibilizados pelo CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) até o mês de novembro de 2024.
A respeito dos aspectos sociais da atividade feminina na viticultura do Vale do São Francisco, a maioria das mulheres se consideram insatisfeitas com a longa jornada de trabalho (de 7h às 19h com intervalo para o almoço), com a constante exposição ao sol, além de dores nas costas pelo excesso de tempo com os braços para cima e a falta de outras oportunidades de emprego na região, o que significa que a escolha por esta atividade se deve à baixa escolaridade, não havendo outras oportunidades de emprego na região (CORREIA; ARAUJO; CAVALCANTI, 2001). Desta forma, apesar de o trabalho feminino ser considerado um trabalho "leve", é uma atividade árdua, exercida durante uma longa jornada diária, em pé, com os braços levantados, com exposição ao sol, o que pode ocasionar sérios problemas de saúde para as trabalhadoras, que acabam submetendo a condições precárias devido a necessidade de manterem o emprego.
*1-Enga. Agrônoma, MSc. em Engenharia de Alimentos e D.Sc. em Educação. Área de Transferência de Tecnologia, Embrapa Semiárido. Petrolina-PE - Analista A - SIPT - Setor de Implementação da Programação da Transferência de Tecnologia Embrapa Semiárido - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Petrolina/PE - licia.marinho@embrapa.br/Tel: (87) 3866-3636/Fax: (87) 3866-3820.
Referências: ABRAFRUTAS. Fruticultura Alavanca Empregos no Vale do São Francisco, 2019. Disponível em: Disponível em: https://abrafrutas.org. Acesso em 03 janeiro de 2025. BRASIL. Ministério do Trabalho. Programa de Disseminação das Estatísticas do Trabalho (PDET). CAGED, dez, 2019. Disponível em: www.ministériodotrabalhoeemprego.gov.br. Acesso em 06 janeiro de 2025. CEPEA. Mulheres Dominam a Viticultura do Vale. In: Revista Hortifruti Brasil, Piracicaba, ano 2019, n. 198, p. 14, mar. 2019. Disponível em: Acesso em 08 de janeiro de 2025. CODEVASF. Petrolina/Juazeiro, 2018. Disponível em: https://www.codevasf.gov.br Acesso em 09 de janeiro de 2025. CORREIA, R. C.; ARAUJO, J. L. P.; CAVALCANTI, E. de B. A Fruticultura como Vetor de Desenvolvimento: O Caso dos Municípios de Petrolina (PE) e Juazeiro (BA), 2001. Disponível em:https://www.embrapa.br. publicações . Acesso em 14 janeiro de 2025. EMBRAPA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.Publicações e bibliotecas. Acesso em 05/01/25. IBGE. Pesquisa Industrial Anual: Empresa 2017. Rio de Janeiro: IBGE, Coordenação de Indústria, 2017. 8 p. Disponível em:<https://biblioteca.ibge.gov.br/index.phpbibliotecacatalogo?view=detalhes&id=71719>.Acesso em: 05 de janeiro de 2025. SEAGRI- BA, Secretaria de Agricultura do Estado da Bahia. Disponível em: https://www.seagri.ba.gov.br.Acesso em:05/01/25SIDRA. Produção Agrícola Municipal. 2024. Disponível em:<https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pam/tabelas>. Acesso em: 09 janeiro 2025. SIDRA. Pesquisa Pecuária Municipal. 2024. Disponível em: <https://sidra.ibge.gov. br/ pesquisa/ppm/referencias>. Acesso em: 09 janeiro de 2025. SILVA, P. C. G. da. Trabalho Feminino na Fruticultura Irrigada no Submédio do Vale do São Francisco. Parte de Livro. Embrapa Semiárido, 2014, p. 75-93.